“Ponte Augusto sobre o rio Marecchia”
O pintor:
Richard Wilson (1713-1782) foi um dos mais importantes pintores paisagistas britânicos do século XVIII sendo frequentemente considerado o precursor da tradição paisagística na Grã-Bretanha. Nascido em Penegoes, Montgomeryshire, no País de Gales, Wilson começou sua carreira como retratista, mas sua trajetória artística mudou após uma viagem a Itália entre 1750 e 1757, onde conviveu com outros artistas e nobres efetuando o Grand Tour. foi profundamente influenciado pelos mestres paisagistas italianos e pela pintura clássica.
Enquanto esteve na Itália, Wilson começou a dedicar-se quase exclusivamente à pintura de paisagens, inspirado pelas vistas italianas de Francesco Zucarelli e pela tradição clássica de artistas como Claude Lorrain e Claude-Joseph Vernet, desenvolvendo um estilo caracterizado por composições harmoniosas, com um uso magistral da luz e uma sensibilidade poética para a natureza.
No regresso a Inglaterra, Wilson conhece a fama principalmente na década de sessenta, estabelecendo um estúdio em Londres, que atinge sucesso com a pintura de paisagem. Foi membro fundador da Society of Arts, fundada em 1754, bem como da Royal Academy of Arts, instituição criada em 1768. Apesar de sua importância artística, enfrentou dificuldades financeiras e um reconhecimento limitado durante sua vida, sendo ofuscado por outros artistas contemporâneos. No entanto, suas obras exerceram grande influência em gerações posteriores de pintores paisagistas, incluindo John Constable e J.M.W. Turner que, quando jovem, admirava o trabalho de Wilson.
Entre suas obras mais conhecidas estão paisagens italianas, como Lago de Albano ou Cícero na sua Villa, bem como cenas britânicas como a Vista de Snowdon. Wilson morreu em Llanberis, no País de Gales, em 1782, em relativa obscuridade, mas seu legado perdura como um marco na história da pintura paisagística.
A pintura:
A pintura, adquirida em 1948, retrata a ponte de Augusto sobre o rio Marecchia, na cidade italiana de Rimini, inserida numa paisagem, tendo sido produzida no período em que Wilson viveu em Itália, certamente depois da sua viagem entre Veneza e Roma no inverno de 1751.
Apesar de a protagonista desta pintura ser a ponte romana com os seus arcos, esta integra-se numa paisagem caraterística do artista, com amplas vistas, céu luminoso, a presença de elementos topográficos, delicados aglomerados de árvores, edifícios, ruínas e a colocação de figuras humanas que emprestam escala e uma pontuação cuidadosa à composição. Nesta pintura, do lado direito ergue-se arvoredo frondoso, descentralizando a composição; e do lado esquerdo ergue-se casario, ao fundo paisagem de montanha representando o Monte Titano, onde se situa a república de San Marino. Em primeiro plano, a composição retrata uma cena de quotidiano, com três figuras femininas a lavar a roupa na margem e no leito do rio que corre com pouca água, enquanto ao fundo, duas outras (uma delas a cavalo) atravessam a ponte.
A pintura não está assinada nem datada.
A ponte Augusto-Tibério em Rimini:
A construção da ponte foi iniciada no ano de 13 dC pelo imperador Augusto e concluída em 21 dC por Tibério (daí a sua designação alternativa como “ponte de Tibério”). Realizada em pedra da Ístria, é constituída por cinco arcos e nichos nos pilares. No interior, possui passeios e tem uma placa evocativa dos dois imperadores e data do início e fim dos trabalhos. Toda a estrutura está apoiada em palafitas. Considerado um dos melhores exemplares da engenharia romana, conseguiu sobreviver até à atualidade, malgrado as vicissitudes por que passou. Ergue-se sobre o rio Marecchia, junto ao Arco Triunfal da cidade, também de Augusto, na saída pela antiga Via Emilia, em direção a Bolonha.
Existem três outras versões desta vista específica, sem assinatura ou data, uma no Museu Ashmolean da Universidade de Oxford, outra na galeria pública de Dunedin na Nova Zelândia, e outra numa coleção particular.
A ponte é ainda retratada pelo artista em dois desenhos que o artista realizou na referida viagem, na qual foi acompanhado de William Lock e Thomas Jenkins. Um dos desenhos, mostrando três arcos, encontra-se no acervo da galeria Tate, em Londres. É sabido que Lock adquiriu ambos os desenhos diretamente do artista. Esta vista foi também reproduzida por outros artistas e em estampas até ao século XIX.
Autenticação:
Na senda do estudo das coleções da Casa-Museu, foi contactado um perito em pintura inglesa que confirmou a atribuição a Richard Wilson.
Kidson referiu ainda que o nome pelo qual a pintura era conhecida no acervo, e que foi o nome que detinha aquando da sua integração no acervo, deveria ser corrigido:
“…The Richard Wilson looks authentic, but the title is incorrect. There is no Rossini River. The bridge is the Ponte d’Augusto over the Marecchia River at Rimini. Your painting is listed in the catalogue Richard Wilson by W. G. Constable, page 212.” Alex Kidson, The Romney Society.
O Richard Wilson parece autêntico, mas o título está incorreto. Não existe um rio Rossini. A ponte é a ponte de Augusto sobre o rio Marecchia em Rimini. A vossa pintura está listada no catálogo Richard Wilson por W.G. Constable, pág. 212 – Alex Kidson, The Romney Society (tradução livre da autora).
A instituição congratula-se com a informação partilhada e aguarda a inspeção visual in loco, sempre necessária quando se avalia uma obra de arte.
Proveniência:
De acordo com a documentação de compra, a pintura integrou originalmente a coleção de David Bromilow Esq. (1809-1898), High Sheriff de Leicestershire, residente em Bitteswell Hall, Lutterworth, Leicestershire. Após o falecimento de Bromilow, a obra foi herdada por sua filha, Julia Harriet Mary Bromilow Jary, que decidiu vendê-la em 19 de julho de 1927.
Subsequentemente, a pintura passou pelas mãos de dois renomados antiquários londrinos: Thos. Agnew and Sons, localizado na Bond Street, e Leggat Brothers, situado na St. James Street. Posteriormente, foi levada para os Estados Unidos, onde foi colocada à venda em Nova Iorque pela Scott and Fowles, uma prestigiada galeria na 680 Fifth Avenue, com o número de inventário 782. Nesse contexto, a obra foi adquirida por J.E. Aldred, um proeminente colecionador norte-americano.
Em maio de 1946, a pintura foi leiloada na Parke Bernet Galleries, também em Nova Iorque, figurando como o lote nº127 do catálogo de vendas. Presume-se que tenha sido nesse período que a obra retornou ao continente europeu, onde encontrou novos destinos.
Finalmente, a pintura foi adquirida por Medeiros e Almeida diretamente na galeria Leggat Brothers, situada na 30 St. James Street, em Londres, em 26 de junho de 1948. O valor pago na transação foi de £850 (libras esterlinas), consolidando sua inclusão na notável coleção de pintura do acervo do Museu Medeiros e Almeida.
Nota: A Casa-Museu Medeiros e Almeida agradece a colaboração do Dr. Alex Kidson da Romney Society, assim como do Professor Paul-Spencer Longhurst através do projeto Richard Wilson Online Catalogue Raisonné.
Cristina Carvalho
Casa-Museu Medeiros e Almeida
Bibliografia:
LOWRY, Kate – Richard Wilson: methods and materials, in Richard Wilson and the transformation of European landscape painting. New Heaven: Yale University Press, 2014.
Richard Wilson Online Catalogue Raisonné:
http://www.richardwilsononline.ac.uk/index.php?a=Home&WINID=1573141944244#WilsonRA
Historic UK – Richard Wilson, Welsh Landscape Painter:
https://www.historic-uk.com/HistoryUK/HistoryofWales/Richard-Wilson-Welsh-Landscape-Painter/
Ponte di Tiberio (Artbonus):
https://artbonus.gov.it/ponte-di-tiberio.html
NOTA: A investigação é um processo permanentemente em curso. Caso tenha alguma informação ou queira colocar alguma questão a propósito deste texto, por favor contacte-nos através do correio eletrónico: info@museumedeirosealmeida.pt