Colcha “Shou Shang”, Destaque Março de 2013

Destaque Março de 2013

Pano de armar “Shou Shang”

Este trabalho analisa um grande pano de seda bordado chinês pertencente ao acervo da Casa-Museu Medeiros e Almeida (em reservas). Trata-se de um pano de armar, comemorativo de aniversário, chamado ‘Shou Shang’, produzido na dinastia Qing, em meados do século XIX, provavelmente do reinado Daoguang (1821-1850) ou Xianfeng (1851-1861).

A Seda 

A palavra China deriva do nome chinês para um tipo de seda; . Tal é a importância da seda, produzida no país desde o período Neolítico (c. 7000-1600 a.C.). Reza a lenda que Hsi Ling Shi, noiva do Imperador Amarelo (2698 a.C.-2599 a.C.), inventou a fiação da seda quando, tomando chá debaixo de uma amoreira, um casulo caiu na sua chávena, fazendo – a água quente – com que os filamentos que envolvem o casulo se soltassem, originando um fio. Havendo ou não algum fundo de verdade em lendas como esta ou outras que povoam o imaginário chinês, o certo é que a sericultura foi praticada na China desde muito cedo, tendo o processo de produção sido mantido como segredo de estado.

Assim, a seda fez parte da economia da China, sendo trocada com os países vizinhos – até mesmo usada para comprar a paz – e exportada através da Rota da Seda iniciada na dinastia Han (206 a.C.-220) e o segredo só se tornou conhecido, na Índia, em cerca de 300. Pela sua beleza e qualidades, a seda era usada no vestuário – principalmente da corte – na decoração em bordados e tapeçarias e na arte, servindo de suporte de pintura, poesia e caligrafia.

Fénix

O segredo da produção de seda está no ciclo de vida da lagarta da espécie bombyx mori: o vulgarmente chamado ‘bicho-da-seda’. No processo de evolução, a lagarta depois de se ter alimentado exclusivamente de folhas de amoreira silvestre durante trinta dias, tece um casulo à sua volta expelindo através das glândulas o líquido da seda – a fibroína – envolvido por uma goma – a sericina – que solidificam com o contacto com o ar. Dentro do casulo transforma-se em crisálida, após sair do casulo rompendo-o, transforma-se em borboleta e antes de morrer põe ovos renovando o ciclo. O processo de tecelagem da seda começa com a imersão dos casulos em água quente antes da saída da crisálida, provocando, pela ação do calor, a dissolução da sericina que une os filamentos num só fio que se desprende do casulo. Com os casulos dentro de água, os fios são recolhidos com um pente e depois dobados. Seguem-se as fases de enrolar, tingir com colorantes vegetais, secar e tecer. São necessários cerca de 5 kg de casulos para produzir 1 kg de seda.

 

A Longevidade e a sua celebração

A longevidade é celebrada na China desde a antiguidade, sendo os anciãos venerados como sinónimo de sabedoria, numa atitude difundida pelo Confucionismo. Em bronzes da dinastia Zhou (1027-256 a.C.) leem-se inscrições alusivas à “augusta longevidade, os textos do filósofo confucionista Mêncio (370 a.C.-289 a.C.), referem o respeito para com os que tinham chegado à velhice, bem como os seus privilégios sociais. O caráter para longevidade – shou – é usado, em forma de selo, desde cedo em todo o tipo de decoração.

Selo da Longevidade / Grou / Peonia

O gosto oriental pelos grandes festejos e presentes, gerou uma quantidade de celebrações, tanto na corte imperial como em todas as camadas sociais, principalmente nas dinastias Ming (1368-1644) e Qing (1644-1911). Entre estas está o Pai Shou que celebra a longevidade; de acordo com a tradição chinesa, quando se completa um ciclo de dez anos após se ter atingido a velhice, realiza-se uma festa em que os parentes e amigos oferecem presentes, nomeadamente este tipo de colchas chamadas Shou Shang, pinturas ou outros objetos, decorados com motivos alusivos à longevidade.

Tradicionalmente o aniversário é celebrado só no primeiro ano da década, tal tem a ver com a ideia de que só então se entra na respetiva década. Como se verá, esta colcha é uma Shou Shang, celebrando o 81º aniversário de uma anciã pertencente a uma venerável família de mandarins, oferecida pelo seu irmão.

 

Os Bordados chineses

Aliada à sericultura, nasce a arte de bordar que originou desde logo panos ricamente decorados, utilizados em rituais, festas e no quotidiano. Esta é uma arte feita por mulheres, existindo tanto produção local como a nível industrial, a perfeição atingida é tal, que os bordados chineses são conhecidos como ‘pinturas de agulha’. Os aspetos técnicos e artísticos foram-se desenvolvendo ao longo dos séculos, dando origem a um grande número de pontos de bordado. Nascem na dinastia Qing as grandes escolas de bordado chinesas, para dar vazão aos pedidos da corte imperial, nomeadamente a de Suzhou, na província Jiangsu, à qual pertence a colcha em estudo.

 

Descrição Formal 

Trata-se de um pano de armar, para pendurar em portas ou paredes ou para usar como colcha, de grandes dimensões, retangular, em cetim de seda, vermelha, bordada a agulha com fios de seda polícromos, utilizando diferentes tipos de pontos bem como uma técnica com recurso à aplicação de fios de seda laminados como é o caso das vestes da deusa ao centro em que o metal empresta à composição riqueza, brilho e contraste com a policromia dos bordados, numa riqueza bem ao gosto da corte Manchu.

A estrutura da decoração é de leitura vertical desenvolvendo-se a partir de um campo central retangular, envolto em duas barras e ainda rematado no topo superior por uma faixa larga. O pano é bordado com três tipos de pontos feitos com agulha; o ponto Suzhou (K’o-ssu), utilizado há séculos, em que o fio vai de um lado ao outro do desenho, com uma inclinação de 45 graus, correndo paralelamente. O fio dourado, feito com uma alma de seda enrolada em papel metálico, não é bordado, mas define ou contornos ou preenche campos enrolando-se, é cosido ao suporte com um ponto simples. O ponto dos pormenores, chamado de contorno, é também inclinado, mas é desencontrado. Estes pontos resultam em três tipos diferentes de reverso.

Pontos de bordado e reverso

O motivo central do pano é uma figura feminina chinesa, representada em tamanho quase natural (93 cm.), a seu lado, um veado, dois morcegos e inscrições bordadas que se traduzem por: (lado direito) “Grande festejo do 81º Aniversário da Madrinha Tai Shu Ren (1) Wen (2) Congratulações à Gao Feng (3) Shu Ren (4) Yang” (5). Lado esquerdo: “Com as cortesias do irmão jurado (mais novo), Tong Zhi (6) na reserva Chen Wen Cheng (7), dos seus filhos: Zhong Han, Han Zhang, Ying Pei, Wei e dos seus netos: Jin Shou, Jin Chao, Jin Sheng, Jin Lin, Jin Pei”.

A faixa que delimita o campo central, é composta por peónias, a rainha das flores e emblema de riqueza e distinção, alternando com o caráter Shou – longevidade – em forma de selo circular, criando uma barra larga a toda a volta. No topo superior, alinham-se horizontalmente, três figuras masculinas; a Tríade da Longevidade, entre elas, um veado com um cogumelo mágico – lingzhi – na boca e um grou.

Dos lados direito e esquerdo dispõem-se verticalmente quatro figuras de cada lado, representando os Oito Imortais Taoistas, entre enrolamentos de nuvens estilizadas e no topo inferior figuram-se um pagode rodeado por morcegos, dois grous, e grupos de rochas e flores nos cantos. Este campo é delimitado por outra faixa, mais estreita, composta por elementos geométricos alternados com flores. A barra exterior é decorada no topo superior por duas fénixes a voar em direção a um sol, os lados com fénixes em voo alternadas com grandes peónias e a parte inferior é decorada com três cães de Fó, machos, brincando com bolas de brocado. O campo do topo superior tem ao centro um dragão de quatro garras segurando uma inscrição, rodeado por duas fénixes com um rolo pendurado no bico, esta área, por não ter estado tão exposta como o resto da colcha, apresenta um vermelho mais vivo, dando uma ideia da policromia original.

Veado / Xi Wang Mu / Morcego

 

Descrição Iconográfica

A decoração da colcha obedece às grandes regras da arte chinesa – todos os elementos são simbólicos e o papel da natureza é preponderante; por isso se contam inúmeras figurações de elementos da natureza como árvores, flores e nuvens (tão forte é a carga simbólica de uma peónia, como a de uma divindade) e vinte e três elementos, todos eles carregados de carga simbólica, sumariamente apresentada. A coroar a composição está o simbolismo hierárquico. A decoração desta colcha evoca os ensinamentos da tradição filosófica e religiosa do Taoismo e relaciona-se com outras duas temáticas base da simbólica chinesa; a Longevidade e a Imortalidade. O pano é vermelho, aludindo à crença que esta cor espanta os maus espíritos.

Os personagens principais pertencem ao panteão taoista; segundo esta filosofia, os imortais são figuras que se libertaram de um mundo terreno cheio de limitações e sofrimento para atingir um mundo celestial onde reinam vivendo pacificamente nas montanhas.

A figura central prefigura a imortal taoista Magu, uma jovem de grande beleza associada aos festejos de aniversário por ser portadora do elixir da vida que aqui ostenta sobre uma bandeja, existindo na tradição chinesa os votos: Magu xian shou (Magu cumprimenta o aniversariante). Os seus atributos são ainda umas longas unhas e um elaborado penteado. Nesta representação surge junto a uns pêssegos, aludindo aos pessegueiros da imortalidade que crescem no paraíso, morada dos deuses, que só dão frutos a cada nove mil anos, conferindo a imortalidade a quem os come. Magu tem ao seu lado um veado, símbolo também ele de uma longa vida, por se tratar do único animal que consegue descobrir os cogumelos mágicos – lingzhi – que conferem a longevidade a quem os come, e cujo caráter é foneticamente similar ao da longevidade – shou. Os dois morcegos que acompanham a deusa, são também símbolos de longevidade e da felicidade conjugal, aludindo à vida da presenteada (o seu caráter é foneticamente semelhante ao da felicidade – fu).

Estas alusões transmitem pois desejos de longa vida e felicidade à festejada.

Fu Xing / Shou Xing / Lu Xing

A Tríade San Xing (três estrelas); Fu Xing, Shou Xing e Lu Xing (da esquerda para a direita) representa a felicidade/sorte, a riqueza/prosperidade e a longevidade, sendo, portanto, uma iconografia adequada à colcha. Estes três personagens imortais, criados na dinastia Ming (1368-1644), são independentes das religiões sendo venerados como imortais ou deuses do lar desde o Palácio Imperial ao mais humilde dos lares:

  • Fu Xing (na língua chinesa, o caráter Fu significa boa sorte, bênçãos e felicidade) – Foi governador no Hunan, o imperador desse tempo gostava muito de anões pelo que mandou que viessem todos para perto dele. Fu, sabendo da sua tristeza por estarem longe das famílias, convenceu o imperador a acabar com a prática ganhando para si a imortalidade. É representado como um oficial de corte com o característico ‘chapéu de asas’ e um ceptro cabeça de ruyi (cerimonial). Representa a felicidade aliada à sorte;
  • Shou Xing – é o mais popular dos três, nasceu com nove anos e uma enorme cabeça. Ao encontrar a estrela do Polo Norte – que dita os nascimentos – e a do Polo Sul – que dita a hora da morte -, Lu partilhou com elas a sua comida tendo recebido a imortalidade. É representado velho, com uma grande cabeça, segurando o pêssego da imortalidade e com um cajado feito de madeira de pessegueiro, aparecendo sempre associado a morcegos, veados, e grous, como é o caso na colcha, que aludem novamente às ideias de longevidade e imortalidade.
  • Lu Xing (o caráter Lu significa salário de oficial feudal) – Nasceu pobre tendo ido trabalhar para a corte num cargo menor. Tendo estudado e trabalhado arduamente, conseguiu ser oficial de corte, um posto reservado a poucos. É representado com um bebé rapaz ao colo aludindo a outra das riquezas e prosperidade para os chineses; a descendência que garante o cuidado na velhice e a continuidade da família.

Do alargado panteão de imortais taoistas, os mais populares e como tal, largamente utilizados em representações artísticas, são conhecidos como os Oito Imortais Taoistas – Pa Hsien. Na iconografia chinesa surgem frequentemente associados à Deusa Mãe e à Tríade, sendo igualmente relacionados com as mesmas temáticas. As suas mágicas vidas no caminho para a imortalidade são contadas no famoso livro Lieh Hsien Chuan da autoria de Liu Hsiang (1 a.C.). Entre relatos que juntam o real e a magia, os oito imortais são caracterizados pelos seus atributos – Pao Pei. (à direita, de cima para baixo):

  • Zhongli Quan / Chung-li Ch’üan – O seu nascimento foi acompanhado por um fenómeno de raios de luz, viveu na dinastia Han (206 a.C.-220) tendo sido um grande general. Na sequência de uma derrota contra os Tibetanos, Quan refugiou-se nas montanhas onde encontrou um padre que o levou até uma aldeia onde um velho lhe concedeu a bênção da imortalidade e o segredo da produção do elixir da vida sendo por isso o mais importante dos oito imortais. Era também calígrafo, representa-se com a barriga gorda nua, semi careca com o cabelo enrolado em dois rolos e segurando um leque com o qual ressuscitava os mortos. É patrono dos guerreiros.
  • Cao Guojiu / Ts’ao Kuo Ch’iu – A tradição diz que era o irmão mais novo de uma rainha da dinastia Song (960-1279) ou Yuan (1279-1268). Saturado da vida palaciana decidiu correr o mundo ajudado por uma moeda oferecida pelo rei com a inscrição:” O imperador deseja que o seu cunhado seja tratado, vá aonde for, sempre como se estivesse acompanhado por Sua Majestade”. Um dia, Lu Dongbin, disfarçado de padre taoista mostrou-lhe a incorreção de se apoiar na carta do cunhado e ele deitou a moeda fora em troca dos favores imortais. Possui um par de castanholas Yin Yang cujo som celestial emudece todos e que lhe conferem o maior poder criativo espiritual pois são complementares e harmoniosas. É representado barbado, em traje de corte, usando uma boina e com um par de castanholas na mão. É patrono dos atores.
  • Han Xiangzi / Han Hsiang Tzu – É o mais novo de todos e é também chamado o Imortal, era sobrinho neto do grande letrado budista Han Yu da dinastia Tang. Rebelde, recusava-se a estudar apesar dos pedidos do seu tio. Detentor dos segredos da natureza, era capaz de fazer crescer flores como por milagre tocando com a sua flauta mágica. A sua existência mortal acabou ao cair de um pessegueiro tornando-se então um imortal. É representado com uma flauta de bambu. É o patrono dos jardineiros e dos músicos.
  • Lan Caihe / Lan Ts’ai-ho – Não se sabe de onde veio, pensa-se que viveu durante as Cinco Dinastias (907-960). Tanto se veste de homem como de mulher, no verão usava roupa pesada e no inverno deitava-se nu na neve, mas permaneceu jovem toda a vida. Bebia muito em restaurantes e tabernas onde cantava cantigas sobre imortais e fazia rir as pessoas, adorava cantar para crianças e idosos. Transportava um cesto com flores e frutos mágicos que comunicavam com os espíritos e estavam associados à ideia de longevidade como o cogumelo lingzhi, rebentos de bambu e de pinheiro, flores de ameixa e crisântemos. Esmolava e o dinheiro que recebia atava a um fio que arrastava atrás de si oferecendo-o aos pobres. Estando numa taberna, ouviu-se uma música e ascendeu ao céu montando um grou. Os seus símbolos são o cesto de flores – por vezes carregado aos ombros – e vestes de homem ou mulher, por vezes é representado descalço pois deixou cair um sapato quando ascendeu ao céu ou com umas compridas castanholas e um fio com que esmolava. É patrono dos jardineiros.

Os Oito Imortais Taoístas (4) – Han Chung Ti / Ts’ao Kuo Ch’iu / Hsiang Tsü / Lan Ts’ai Ho

(à esquerda, de cima para baixo)

  • Lu Dongbin / Lü Tung-Pin – Viveu na dinastia Tang (618-906), falhou duas vezes os exames imperiais e aos 64 anos, com a ajuda de Han Zhongli atingiu a imortalidade. Depois de ter resistido a dez tentações, foi-lhe oferecida uma espada chamada yin yang que lhe conferia o dom da invisibilidade, com a qual fabricava o elixir da imortalidade e com que atravessou a terra onde permaneceu 400 anos, matando os males morais do mundo. Fundou a escola de alquimia Flor Dourada, muito popular na China Tang. É representado como um letrado com o característico chapéu de 3 bicos e uma espada às costas. É o patrono dos alquimistas, dos letrados e dos barbeiros.
  • Zhang Guolao / Chang Kuo – Chamado o Velho pois tinha sempre aparência de velho sendo um eremita. Viveu no séc. VII ou VIII da dinastia Tang, montava uma mula branca que percorria diariamente milhares de quilómetros sem ter sede, quando parava para descansar, dobrava a sua montada como uma folha de papel e escondia-a no cesto. Quando queria continuar a jornada, assoprava ou espalhava um pouco de água no cesto e o animal aparecia. Era um mestre da magia e da adivinhação tendo aprendido com o imperador Yao. O seu atributo é um tambor tubular de bambu coberto com pele de peixe – tambor de peixe – e as baquetas para nele tocar, o som indica o começo de uma nova vida, como tal, trazia felicidade aos jovens casais. Representa os idosos e é o patrono de artistas e calígrafos, sendo considerado como um dos deuses da literatura.
  • Li Tieguai / Li T’ieh-Kuai – Seu nome significa ‘muleta de ferro’, viveu na dinastia Tang (618-906) e adquiriu a imortalidade com o próprio Lao Tse (filósofo Taoista). Como era um padre taoista fazia muitas viagens espirituais deixando o seu corpo alto e bonito na terra a cargo de um dos seus discípulos. Tendo demorado para regressar o discípulo queimou o seu corpo, pelo que teve que entrar no de um mendigo coxo acabado de morrer continuando assim o seu caminho para a imortalidade apoiando-se numa muleta dos mortos que era de bambu e se transformou em ferro. Fazia pílulas da imortalidade numa cabaça para salvar as pessoas. É representado como um velho mendigo feio, coxo e andrajoso apoiando numa muleta e segurando uma cabaça de onde sai um vapor. É o patrono dos médicos e dos mendigos.
  • He Xiangu / Ho Hsien-Ku – A única mulher, viveu na dinastia Tang (618-906), nasceu com seis cabelos dourados. Quando os pais morreram refugiou-se nas montanhas, deixou de comer cereais e jurou manter-se virgem. Porém a madrasta obrigou-a e um dia, quando estava a cozinhar arroz, o imortal Lu Dongbin veio libertá-la e deu-lhe a imortalidade. Sabia predizer o destino das pessoas. Sendo Taoista, é representada segurando uma flor de lótus, símbolo mágico adotado também pelo Budismo numa alusão à sua libertação do mundo terreno em relação ao espiritual. É a patrona das donas de casa.

Os Oito Imortais Taoístas (4) – Lü Tung Pin / Han Chang Kuo Lao / Li T’eh Kuai / Ho Hsien Ku

A existência de várias fénixes alude à condição feminina da presenteada – pois são o símbolo da imperatriz – e à alegria, justiça e paz que estão relacionadas com a presença desta criatura sobrenatural que só aparece em tempos de paz e de um reinado justo. As duas fénixes com um rolo no bico, deverão simbolizar o gosto pela pintura, poesia e caligrafia, logo a erudição da presenteada. O dragão do topo da composição remete para a posição social da família; o facto de ter quatro garras indica que são nobres (5 garras é de uso exclusivo do imperador e três dos não nobres). Pelas inscrições podemos verificar que se trata de uma família de mandarins (oficiais da corte), de grau III (numa escala de nove), uma honra muito elevada.

 

A tradição continua…

A China tem a mais longa tradição cultural do mundo sendo o campo das artes por excelência, guardião de valores estéticos advindos do sistema de aprendizagem artística que se fundamentava na cópia dos mestres antigos.
Apesar da colcha ter sido feita já no século XIX, ela encerra em si elementos que se mantiveram inalterados através de séculos como o simbolismo ideológico, a celebração da longevidade, a piedade filial, o ritual das ofertas, a veneração dos antepassados e o perfecionismo, proporcionando uma leitura das características tradicionais chinesas – mais do que as fórmulas, são os valores que se mantiveram eternos.

 

Proveniência:

O pano de armar foi adquirido por Medeiros e Almeida em leilão da Soares e Mendonça, R. Luz Soriano (53, 1º) em Lisboa, a 18 de novembro de 1967, (lote 481), por 5.000$00.

 

 

NOTA: A autora agradece a Rui Ferreira da Liga da Multissecular Amizade Portugal-China, a tradução das inscrições (2012)

 

Maria de Lima Mayer
Casa-Museu Medeiros e Almeida

 

 

Bibliografia:

GROUSSET, René, Chinese Art and Culture; London, Andre Deutsch Limited, 1959

HANYU, Gao, Soieries de Chine, Adapté du chinois par KONTLER, Christine, CHUN, Dong; Paris, Fernand Nathan Éditeur, S.A., 1987

JORGE, J. V., Notas sôbre a Arte Chinesa, Macau, Tip. Mercantil de N. T. Fernandes & Filhos Ltda, 1940

SHAUGHNESSY, Edward L., A Antiga China, tradução: SILVA, Ana Maria Pinto da; Madrid, Círculo de Leitores, 2006

TREGEAR, Mary, Chinese Art, London, Thames & Hudson Ltd., 2006

WATT, James C. Y., WARDWELL, Anne E., When Silk was Gold – Central Asian and Chinese Textiles; New York, The Metropolitan Museum of Art, 1997

Publicações on line:

ALVES, Ana Cristina; Símbolos dos Oito Imortais Daoístas, Idearte, Revista de Teorias e Ciências da Arte, Vol.9, 2010 http://ml.ci.uc.pt/mhonarchive/museum/msg04841.html


CRETU, Ileana, LUPU, Mihai I., Materials used in Chinese Textiles from the National Museum of Art of Romania, e-conservation on line magazine, nº3, fevereiro, 2008 http://www.e-conservationline.com/content/view/600/178/


YETTS, W. Percival, The Eight Immortals, The Journal of the Royal Asiatic Society of Great Britain and Ireland for 1916, London, 1916 (reduced to HTML by Christopher M. Weimer, August 2002) http://www.public-domain-content.com/books/journals/jras/1916-21.shtml

Dicionários:

EBERHARD, Wolfram, A Dictionary of Chinese Symbols, Hidden Symbols in Chinese Life and Thought; London, Routledge & Kegan Paul, 1986

WILLIAMS, C.A.S., Chinese Symbolism and Art Motifs; Singapore, Tuttle Publishing, 2006

Autor

Desconhecido

Data

Meados séc. XIX

Local

China

Materiais

Cetim de seda, fio de seda e fio de seda laminado a folha metálica

Dimensões

Alt. 324cm. x Larg. 187cm.

Category
Destaque