Cigarreira Bogatyrs, 1908-1917

Cigarreira Bogatyrs, 1908-1917

Caixa cigarreira retangular de abertura lateral, em prata dourada e totalmente decorada com esmaltes polícromos em trabalho de cloisonné; sobre fundo azul forte são representadas flores e enrolamentos vegetalistas convivendo com formas geométricas. Na tampa a decoração é interrompida por reserva com miniatura da obra “Bogatyrs”, pintada sobre esmalte, do pintor russo Viktor Vasnetsov.

 

O fecho, no lado direito da caixa, tem incrustada uma safira oval.

 

A cigarreira tem marca dos ateliers de Moscovo da Casa Fabergé, tendo sido produzida entre 1908 e 1917.

 

Autoria:

Esta peça tem o cunho da Casa Fabergé, considerada uma das melhores joalharias de todos os tempos, fundada por Gustav Fabergé em 1842 e continuada pelo seu filho Peter Karl Fabergé.

 

Peter Karl nasceu a 30 de maio de 1846 em São Petersburgo. O seu pai, Gustav Fabergé, que abrira uma joalharia em S. Petersburgo em 1842, era descendente de huguenotes, e a sua mãe, Charlotte Jungstedt, filha de um pintor de origem dinamarquesa.

 

Peter Karl frequentou uma das melhores escolas de São Petersburgo e, mais tarde, dará continuação à sua formação de joalheiro sob a tutela de Peter Hiskias Pendin, colega e amigo do pai e que teve uma grande influência nele. Na sua juventude viajará para a Alemanha, Inglaterra, Itália e França, o que se tornará fundamental para o desenvolver do seu gosto e da sua futura prática.

 

Em 1870, com só 24 anos, passará a dirigir a empresa familiar que o seu pai, retirado desde 1860 em Dresden, tinha deixado ao cuidado do gerente. Isto suporá uma grande revolução para o negócio, que deixará de estar baseado exclusivamente na criação de joalharia tradicional para apostar na produção de objetos decorativos de grande imaginação, perfeição técnica e beleza, mas sem forçosamente ter um valor material intrínseco.

 

Apesar da diversidade das peças produzidas pela Casa Fabergé – desde joalharia a objetos funcionais como esta caixa cigarreira, objetos decorativos, pequenos brinquedos, etc. – são sem dúvida, os Ovos de Páscoa Imperiais, as suas mais famosas criações. Estes ovos foram realizados anualmente – desde 1884 – para o czar Alexandre III oferecer como presente à sua mulher, a Imperatriz Maria Feodorovna.

 

Mais tarde será o filho deste, Nicolau II, que continuará a tradição de oferecer um ovo Fabergé à sua mulher, Alexandra Feodorovna, e à sua mãe, perfazendo este conjunto um total de 57 peças.
Em 1918, a empresa é nacionalizada e Fabergé, deixando de ser o joalheiro da corte imperial, emigra para Lausanne, na Suíça, onde morre em 1920.

 

O autor da cigarreira é dos mestres ourives a trabalhar para a Fabergé; Feodor Rückert (1840-1917). Rückert trabalhava em Moscovo por conta própria, fornecendo peças – principalmente com esmaltes – para a Fabergé, a Ovchinnikov e a Kurlyukov. O seu trabalho é reconhecido pela inspiração na arte e folclore russos.

 

“Os Bogatyrs”:


Esta pintura conhecida como “Bogatyrs”, um óleo sobre tela, obra de Viktor Vasnetsov, datada de 1898, de dimensões consideráveis (295,3 X 446) representa Ilya Muromets, Dobrynya Nikitich e Alyosha Popovich, três heróis medievais russos cujas aventuras para defender a sua terra e os seus habitantes contra os inimigos da Rússia são contadas em muitos poemas épicos e lendas tradicionais. Aqui aparecem guardando a fronteira atentos a um iminente perigo, mas na forma em que são retratados, Vasnetsov consegue transmitir-nos não só um episódio concreto, mas a história por trás destes cavaleiros do folclore popular russo.

 

No centro está Ilya, considerado tradicionalmente o líder do grupo. Forte e alto aparece vestido de forma simples, como corresponde a um filho de camponeses. O seu cabalo, de nome Voroneyushko, será o típico dos bylina, poemas épicos tradicionais russos. Segundo a lenda, Ilya nascera débil e doente, até que um dia miraculosamente sara para se converter em guerreiro ao serviço do Príncipe Vladimir.

 

À esquerda aparece Dovynya que, como podemos ver pela sua elegante armadura, escudo vermelho e dourado, vestes bordadas e cadeia dourada ao peito, é filho de um príncipe. O seu cabalo branco, um puro-sangue árabe de bridas ricamente ornamentadas, será também um indicador da sua classe.

 

À direita Alyosha, o mais novo dos três heróis e o preferido do Príncipe Vladimir, aparece armado com arco e flechas e vestido de uma forma modesta, mas elegante. Aliosha, filho de um sacerdote, não será só um guerreiro como também um diplomata, orador e músico, conhecido pela sua astúcia e pelas inteligentes estratégias com as que vence aos seus inimigos.
Esta obra, hoje em dia na Galeria Tretyakov de Moscovo, é conhecida de todos os russos como símbolo de patriotismo e nela o pintor Vasnetsov trabalhou durante mais de uma década.

 

Viktor Mikhaylovich Vasnetsov (1848-1926):

Artista russo conhecido pela sua temática histórica e mitológica e que normalmente se enquadra dentro do modernismo folclórico-romântico russo.
Nascido numa pequena vila no seio duma família culta, começa a pintar já em criança e após graduar-se no seminário em 1867, decide trasladar-se para São Petersburgo para estudar arte, para o que venderá duas das suas pinturas para pagar a viagem.

 

No início da sua carreira estará próximo do movimento realista, e a sua obra estará virada para a pintura de género, porém, após uma estadia de um ano em Paris, onde estuda os clássicos e os contemporâneos e chega a expor alguns dos seus trabalhos no Salon, começará a interessar-se pela mitologia, o folclore e os contos de fadas russos, temática que na época, todavia não era muito apreciada.

 

Entre 1884 e 1889 pintará os frescos da Catedral de Kiev, e será nessa época que começa a sua obra mais famosa, “Os Bogatyrs”. Nas duas últimas décadas da sua vida estenderá os seus interesses para outras áreas, como a cenografia, o desenho, os mosaicos e, nomeadamente, a arquitectura. Entre outras construções desenhará a sua própria casa, hoje em dia Casa-Museu Victor Vasnetsov, que forma parte da Galeria Tretyakov, e onde se encontram em exposição muitas das suas obras.

 

Marcas:
Marca da Casa Fabergé: K FABERGE em cirílico sob águia imperial, sobreposta à marca do workmaster Feodor Rückert. Marca em perímetro oval oblongo 88 (zolotniks = prata toque .916) com perfil feminino – Kokoshnik – virado à direita e marca de Moscovo; um alfa (triângulo) do alfabeto grego.

 

Técnica:

Cloisonné é uma técnica de trabalho em esmalte na qual tiras finas de metal são coladas sobre uma superfície, formando um desenho composto por pequenos compartimentos depois preenchidos com pasta de esmalte vitrificado de várias cores.

 

Proveniência:

A cigarreira foi adquirida no leilão “Fine Gold Boxes, Objects of Vertu, Clocks and Watches, Fabergé and Russian Works of Art” da Sotheby’s, em Zurique, a 16 de Novembro de 1977, onde Medeiros e Almeida comprou também cinco relógios de bolso presentes na coleção.

 

Samantha Coleman Aller
Casa-Museu Medeiros e Almeida

Artista

Casa Fabergé; Feodor Rückert (1840-1917) - Ourives; Viktor Vasnetsov (1848-1926) - Pintura

Ano

1908-1917

País

Russia, Moscovo

Materiais

Prata dourada, esmaltes e safira

Dimensões

11cm x 9cm

Category
Caixas de Tabaco Russas